
Aqueles que acham isso normal e justo, já estão com seus espíritos condenados, ainda que seus corpos estejam livres.
Em 2 de março de 2019, um avô estava com as mãos livres para acenar e abraçar durante o velório do seu neto. Mãos que somam apenas nove dedos. Era o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso na sede da Polícia Federal em Curitiba após condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá, investigado pela Operação Lava Jato. Sua pena era de 12 anos e 1 mês.
Hoje, ele é presidente da República por causa de um CEP, por causa de uma decisão monocrática do ministro Fachin — o mesmo que impediu a polícia de atuar nos morros do Rio de Janeiro para combater o narcotráfico.
Lula teve direito a ampla defesa. Foi condenado em todas as instâncias. Os depoimentos e provas contra ele foram analisados por uma dezena de juízes. Sua prisão só ocorreu depois do julgamento e condenação em tribunais superiores. Teve todos os direitos assegurados, mesmo diante de crimes de proporções nacionais. Teve, inclusive, direitos humanos.
E não apenas isso: Lula não ficou em uma prisão comum. Ficou em um cômodo de 15 m², com banheiro privativo. Podia assistir jogos do Corinthians, dar entrevistas, receber amigos, governadores que hoje são seus ministros. Podia ter visita íntima com Janja. Era quase um hotel de luxo quando comparado à Papuda, onde foram lançados milhares de inocentes do 8 de janeiro.
Não há qualquer dúvida sobre os crimes cometidos por ele. Ainda que tenham “estancado a sangria”, como disse Romero Jucá, ainda que tenham anulado condenações por questões processuais, ainda que tenham jogado no lixo delações premiadas legítimas, ainda que tenham devolvido bilhões roubados a corruptos, nada pode apagar a verdade. Ela não apenas foi comprovada no passado, como é reforçada agora, no Lula 3, na escolha de ministros corruptos e no desvio bilionário de aposentadorias de idosos.
Ainda assim, o maior corrupto da história recebeu do poder público tratamento humanizado, com regalias. Ele pôde se despedir do seu neto de 7 anos. Chegou ao enterro como uma celebridade, não como presidiário. Acenou com as mãos, abraçou, desfilou livremente entre as pessoas.
Enquanto isso, tudo foi negado ao preso político e advogado de 30 anos, Lucas Brasileiro.
Eis o crime desse jovem: estava em Brasília no dia 8 de janeiro prestando um concurso. Ao sair, passou pela Praça dos Três Poderes, onde helicópteros lançavam bombas de gás lacrimogêneo. Para se proteger, entrou nos prédios que estavam com as portas abertas. Isso bastou para ser preso e condenado pela Justiça a 12 anos e 6 meses de prisão, com as seguintes acusações:
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito
- Tentativa de golpe de Estado
- Dano qualificado
- Deterioração de patrimônio tombado
- Associação criminosa armada
Lucas está preso há mais de um ano. No dia 26 de agosto, sua avó faleceu. Com muito custo, conseguiu liberação para comparecer ao enterro. Primeiro, o pedido foi negado sob alegação de falta de contingente e transporte. Mas, depois que o pai divulgou nas redes sociais um documento, a penitenciária mudou de ideia e reuniu rapidamente 30 policiais armados para escoltá-lo.
Chegou ao cemitério algemado, abatido, vestido como presidiário e cercado por armas. Não pôde abraçar a própria mãe. Uma cena de terror que choca quem assiste — imagine para quem estava lá.
Para Lucas, não houve direitos humanos. Não houve humanidade. Apenas dor, trauma e humilhação.
Na Papuda, ele não tem regalias. Já houve denúncias até de tentativa de asfixiá-lo.
Não discuto aqui a condenação do 8 de janeiro. Para início de conversa, essas pessoas nem deveriam estar sendo julgadas pelo Supremo Tribunal Federal! Todo esse processo é ilegal, imoral e desumano. Choca qualquer pessoa de coração vivo e só causa prazer ou indiferença àqueles cuja consciência já está cauterizada.
O avô do Arthur representa um Brasil: o da impunidade, da exaltação ao crime, da corrupção generalizada, da injustiça.
O neto da dona Joanice representa outro Brasil: o que luta pela liberdade, pela legalidade e pela justiça. O Brasil cujo coração ainda pulsa, cuja consciência ainda distingue o certo do errado.
De que Brasil você faz parte?
A indiferença sempre nos joga para um lado: o da conivência com o mal.
Que tipo de Brasil teremos se permanecermos governados pelo crime, onde inocentes são punidos enquanto culpados são exaltados? Hoje é o Lucas. Amanhã pode ser qualquer um de nós. Um gesto, uma palavra, qualquer coisa pode levar alguém à prisão e destruir sua vida e de sua família. Alguns já perderam tudo — como o caso do Clezão.
Queira Deus que, pela idade desses dois presos, o Brasil de Lula esteja passando — e chegando ao fim. Um Brasil que Arthur teria vergonha de viver.
E que o Brasil de Lucas seja o que está nascendo: aquele que, mesmo sofrendo injustiças, saberá valorizar a liberdade quando ela for resgatada.
O Brasil pelo qual sua avó clamou antes de partir.
Não é coincidência, mas um sinal: seu nome é Lucas Brasileiro. E ele representa a maioria que não desistirá do país.
Adriana Garcia
Jornalista na Amazônia
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